Numa noite de tempestade, uma fugitiva da repressão na Comuna de Paris chega à casa das irmãs Martine e Philippa, num vilarejo norueguês. Com uma carta de recomendação de Monsieur Papin, cantor de ópera que no passado fora apaixonado por uma das irmãs, Babette passa a oferecer seus serviços de cozinheira em troca de abrigo. Até o dia em que ganha dez mil francos na loteria.
Babette se oferece para preparar um banquete à francesa em homenagem ao falecido pai de suas benfeitoras. Ainda que receosas e preocupadas, as irmãs aceitam o tal banquete...
A situação conflituosa entre o banquete de Babette e a religiosidade e auteridade das irmãs Martine e Philippa, conforme vemos nas enxutas 64 páginas do livro, suscita interpretações sagazes.
Sem qualquer indício de agressividade explícita, e acompanhada por uma atmosfera de beleza, a trama mostra o exercício de uma religiosidade ortodoxa e dogmática, que acaba por se revelar altamente egoísta. Especialmente no que diz respeito às duas irmãs que, tendo renunciado a um destino de felicidade e realizações, se mantêm fiel ao falecido pai (que fazia parte da classe eclesiástica) e à prática do desapego. Os habitantes do vilarejo, tal como Martina e Philippa, levam uma vida austera e insípida; os excessos, o carnal, o mundano, e o prazer - inclusive em relação à boa comida - são condenados.
Babette dará novo colorido ao vilarejo de Berlevaag durante o banquete - fonte de prazer e pecado, mas também de felicidade - que deseja oferecer na casa das irmãs. Motivada pela generosidade, mas, e principalmente, pela artista que tem dentro de si, a francesa vê no banquete o deleite dos convidados e também algo de realização pessoal. Provar algo a si mesma e aos demais em fins do século 19, e na posição de uma mulher, requer coragem e determinação além do visível.
O texto “fácil” e a mensagem que ele traz fazem de A Festa de Babette, conto mais conhecido da dinamarquesa Karen Blixen, uma leitura daquelas que a gente tem vontade de recomendar.
Mas será que a boa e fiel criada se dava conta de que partindo de Berlevaag estaria deixando tanta gente velha e pobre mergulhada em aflição? Suas caras irmãzinhas não teriam mais tempo para os enfermos e desvalidos. Sem sombra de dúvida, loterias eram uma coisa blasfema.
LEIA PORQUE...
A adaptação cinematográfica do conto é bastante aclamada, tendo levado o Oscar de filme estrangeiro em 1988. DA EXPERIÊNCIA...
Surpresa das boas. Sem falar que é inevitável traçar um paralelo entre as habilidades gastronômicas de Babette, que não haviam sido plenamente reconhecidas por ser mulher, e o fato de a autora ter sido mais conhecida pelo pseudônimo masculino Isak Dinesen.FEZ PENSAR EM...
Comida! Na sopa de tartaruga. Na Comuna de Paris, o primeiro governo em que o papel governante cabia à classe operária. E na necessidade vital do artista de mostrar seu potencial.Título: A Festa de Babette
Título original: Babette’s feast
Autor(a): Karen Blixen
Editora: Cosac Naify
Edição: 2012
Ano da obra: 1950 (na revista Ladies’ Home Journal), 1958 (no livro Anecdotes of Destiny)
Páginas: 64
Aline T.K.M.
Criou o Livro Lab há 12 anos e se dedicar a este projeto é uma das coisas que mais ama fazer, além de estar em contato com os mais variados tipos de expressões artísticas. Tem paixão por cinema, viajar e conhecer outras culturas. Ah, e ama ler em francês!
7 comentários
Ainda não conhecia este livro, mas deve ser tudo de bom... comida, Paris... adorei o cenário!
ResponderExcluirBeijos
Dani
http://chabiscoitoseumlivro.blogspot.com
Que resenha deliciosa, Aline! (E olha que o trocadilho nem foi proposital!)
ResponderExcluirNunca havia ouvido falar desse livro, tampouco de sua adaptação cinematográfica, mas fiquei bastante interessada na leitura!
Beijos,
Nanie
Adorei a resenha, o livro parece ser ótimo. Paris e gastronomia é uma combinação perfeita <3
ResponderExcluirTem resenha e sorteio do livro A Garota da Casa Grande lá no blog, participe!
semgenero.blogspot.com.br
Acho esse título tão bonitinho! É bom saber que ele é curto, dá pra ler na minha hora de almoço!
ResponderExcluirMareska, dá sim para ler o livro rapidinho, de um só fôlego (apesar de eu ter demorado uns diazinhos aí). E essas edições de bolso da Cosac Naify são uma graça, muito caprichadinhas.
ExcluirNOSSA, EU NUNCA IA ADIVINHAR QUE ISSO É UM LIVRO!!! Acontece que eu vi o filme anos e anos atrás e nem passou pela minha cabeça que poderia ser uma adaptação. Confesso que na época não achei o filme lá essas coisas, mas me parece ser um daqueles filmes que vc tem que assistir em fases diferentes da sua vida pra realmente entender. E ler o livro talvez ajude! hahaha
ResponderExcluirBjs! http://nasquartasusamosrosa.blogspot.com.br/
Pois é, eu sempre ouvia falar no filme (principalmente durante a faculdade) e só descobri que era livro há uns meses. E sabe, ainda não vi o filme! Mas pretendo; imagino que não seja algo assim inesquecível, mas concordo que deve ser daqueles que trazem um significado diferente dependendo da fase em que você assiste. Beijo!
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