Cada vez que uma escolha é feita, mesmo a mais individual delas, sua consequência reverbera e acaba tocando outras vidas de maneira inevitável. Já parou para pensar nisso? Um dado acontecimento implica em outro e mais outro, numa corrente que só existe, afinal, por causa daquela primeira situação. Despretensioso – no entanto, poderosíssimo –, A Maçã Envenenada trata disso, mas não só.
No segundo volume da trilogia – os livros são independentes entre si – sobre fatalidades históricas e seus efeitos a nível individual, Michel Laub nos apresenta a um jovem estudante de dezoito anos que cumpre o serviço militar em Porto Alegre e toca guitarra em uma banda de rock. É 1993 e ele se encontra diante de um dilema quando tem que decidir se foge do quartel para assistir ao show do Nirvana em São Paulo ao lado da namorada, Valéria.
A história desse jovem e de sua conturbada relação com a primeira namorada é entrelaçada a dois fatos da época, tão relevantes quanto trágicos: o suicídio de Kurt Cobain, líder do Nirvana, em 1994; e o genocídio em Ruanda, relacionado a rivalidades étnicas e políticas, que ocasionou cerca de 800 mil mortes em cem dias.
Em primeira pessoa, o protagonista tenta compreender as motivações por trás do suicídio de Cobain, ato que o mundo tratou de envolver em uma aura romântica e heroica. Em paralelo, narra a luta da garota ruandesa Immaculée Ilibagiza que, para escapar da morte, passou noventa dias escondida em um minúsculo banheiro com outras sete mulheres, enquanto o genocídio lhe tirava a família, a casa e tudo o que fazia parte de sua vida.
Kurt Cobain teria pensado na mulher e na filha bebê ao despedir-se do mundo da maneira como o fez? Existe alguém no mundo em posição de julgar se seu ato foi covarde, egoísta? Trancada num banheiro, comendo restos de comida e fazendo suas necessidades em meio a sete outras mulheres, Immaculée nunca pensou em outra coisa senão sobreviver.
Para o jovem narrador da trama, tudo gira em torno de Valéria. Ele conhece a primeira namorada num bar, ela pergunta sobre a vaga de vocalista na banda, e não demora muito para que se envolvam em uma intensa relação. Valéria, a garota misteriosa e atraente, se revela um tanto instável.
Na verdade, tudo é simples e complexo a um só tempo; a vida acontece, as pessoas se veem em situações extremas, escolhas são feitas a todo instante. No caso do protagonista, seu destino está fadado a ser decidido a partir daquele evento, o show do Nirvana no estádio do Morumbi, no festival Hollywood Rock, no início de 1993.
É com palavras sinceras e carregadas de um peso quase insuportável – embora impulsionadas pela narrativa ágil – que o autor relembra fatos, passa pela montanha-russa da vida do protagonista e coloca questões em sua boca, cujas respostas muitas vezes também nos faltam a nós, leitores.
Poético e pontiagudo, A Maçã Envenenada retrata uma geração desiludida, e revela como fatos, escolhas e perdas são capazes de moldar tanto os indivíduos centrais como também os que orbitam ao seu redor. No fim, nós somos as escolhas – as nossas e as alheias – e somos também as nossas perdas: elas nos definem, nos esculpem e causam erosões tamanhas que nem todas as partículas do tempo conseguem recuperar.
With eyes so dilated, I've become your pupil
You've taught me everything without a poison apple
No segundo volume da trilogia – os livros são independentes entre si – sobre fatalidades históricas e seus efeitos a nível individual, Michel Laub nos apresenta a um jovem estudante de dezoito anos que cumpre o serviço militar em Porto Alegre e toca guitarra em uma banda de rock. É 1993 e ele se encontra diante de um dilema quando tem que decidir se foge do quartel para assistir ao show do Nirvana em São Paulo ao lado da namorada, Valéria.
A história desse jovem e de sua conturbada relação com a primeira namorada é entrelaçada a dois fatos da época, tão relevantes quanto trágicos: o suicídio de Kurt Cobain, líder do Nirvana, em 1994; e o genocídio em Ruanda, relacionado a rivalidades étnicas e políticas, que ocasionou cerca de 800 mil mortes em cem dias.
Em primeira pessoa, o protagonista tenta compreender as motivações por trás do suicídio de Cobain, ato que o mundo tratou de envolver em uma aura romântica e heroica. Em paralelo, narra a luta da garota ruandesa Immaculée Ilibagiza que, para escapar da morte, passou noventa dias escondida em um minúsculo banheiro com outras sete mulheres, enquanto o genocídio lhe tirava a família, a casa e tudo o que fazia parte de sua vida.
Kurt Cobain teria pensado na mulher e na filha bebê ao despedir-se do mundo da maneira como o fez? Existe alguém no mundo em posição de julgar se seu ato foi covarde, egoísta? Trancada num banheiro, comendo restos de comida e fazendo suas necessidades em meio a sete outras mulheres, Immaculée nunca pensou em outra coisa senão sobreviver.
Para o jovem narrador da trama, tudo gira em torno de Valéria. Ele conhece a primeira namorada num bar, ela pergunta sobre a vaga de vocalista na banda, e não demora muito para que se envolvam em uma intensa relação. Valéria, a garota misteriosa e atraente, se revela um tanto instável.
Há uma ambiguidade na forma como se lida hoje com o tema da doença. Ao mesmo tempo em que se fala das vantagens de ter uma vida saudável, o que inclui alimentação, exercício físico, restrição de tabaco, um padrão estético e de comportamento martelado por publicidade, TV e campanhas governamentais, existe um glamour em torno das neuroses. Difícil achar um filme hollywoodiano cujo herói tenha comportamento convencional. Nada é mais popular em redes sociais do que parecer inconformado, excessivo, imprevisível, uma forma mais modesta do clichê que vê na genialidade um prolongamento da loucura.
Na verdade, tudo é simples e complexo a um só tempo; a vida acontece, as pessoas se veem em situações extremas, escolhas são feitas a todo instante. No caso do protagonista, seu destino está fadado a ser decidido a partir daquele evento, o show do Nirvana no estádio do Morumbi, no festival Hollywood Rock, no início de 1993.
É com palavras sinceras e carregadas de um peso quase insuportável – embora impulsionadas pela narrativa ágil – que o autor relembra fatos, passa pela montanha-russa da vida do protagonista e coloca questões em sua boca, cujas respostas muitas vezes também nos faltam a nós, leitores.
Poético e pontiagudo, A Maçã Envenenada retrata uma geração desiludida, e revela como fatos, escolhas e perdas são capazes de moldar tanto os indivíduos centrais como também os que orbitam ao seu redor. No fim, nós somos as escolhas – as nossas e as alheias – e somos também as nossas perdas: elas nos definem, nos esculpem e causam erosões tamanhas que nem todas as partículas do tempo conseguem recuperar.
LEIA PORQUE
Cada frase de A Maçã Envenenada ganha um eco tremendo dentro do leitor. Soco no estômago, acompanhado de beleza disforme e reflexão.DA EXPERIÊNCIA
Ao abrir o livro, jamais imaginava que fosse encontrar o que encontrei. Só me arrependo de não o ter lido muito antes.FEZ PENSAR EM
Drain you, música do Nirvana que aparece em alguns momentos da trama.With eyes so dilated, I've become your pupil
You've taught me everything without a poison apple
Onde comprar: Submarino
Título: A Maçã Envenenada
Autor(a): Michel Laub
Editora: Companhia das Letras
Edição: 2013
Ano da obra: 2013
Páginas: 120
Aline T.K.M.
Criou o Livro Lab há 12 anos e se dedicar a este projeto é uma das coisas que mais ama fazer, além de estar em contato com os mais variados tipos de expressões artísticas. Tem paixão por cinema, viajar e conhecer outras culturas. Ah, e ama ler em francês!
6 comentários
Não conhecia o livro, mas, posso dizer pela sua resenha, que é diferente de tudo o que já li. Dá pra notar o toque "efeito borboleta" na trama, e esse é um dos assuntos que mais me instiga. Ótima resenha!
ResponderExcluirBeijos! | ape56.blogspot.com
Sim! Também pensei nisso por um instante durante a leitura, só resolvi não colocar na resenha por receio de que talvez gerasse uma expectativa meio distante do que o livro realmente é. Ele dá essa ideia de "efeito borboleta" em alguns momentos, mas as consequências das coisas estão muito mais dentro do contexto mesmo das situações, coisas que cedo ou tarde acabariam por acontecer, pelo menos eu vi assim. Beijinhos!
ExcluirInstigante, Aline.
ResponderExcluirVou colocar na lista.
Beijos,
Ronize Aline
Oi Ronize, vale a pena, viu!! Gostei muito da narrativa do autor e agora tô curiosa para ler mais coisas dele. Beijo!
ExcluirAdorei! Vou comprar para presentear meu filho de 16 anos que é louco pelo Nirvana e de quebra vou ler também! Empolgadíssima
ResponderExcluirDesculpe a demora gigantesca em responder! Me diz depois se ele gostou do livro - tenho quase certeza que sim! E você, curtiu também?! Beijão!
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