Quote da quinzena: Em caso de felicidade, de David Foenkinos
À la française 16 de agosto de 2016 Aline T.K.M. 2 comentários
O que é felicidade para você? No livro Em caso de felicidade, David Foenkinos mexe com a percepção desse estado ou sentimento tão difícil de definir, a partir de um casal que se acomodou na rotina e enxerga no adultério um novo tempero para suas vidas.
Jean-Jaques e Claire são um daqueles casais que parecem perfeitos – apenas na fachada. Na realidade, o tédio reina na relação dos dois, que tem como fruto uma menina chamada Louise. Ele resolve ter uma amante. Ela decide contratar um detetive para seguir o marido e tirar a limpo essa suspeita de traição, mas acaba se envolvendo com o próprio detetive.
Com o bom humor e as sacadas irônicas – que eu tanto adoro – de Foenkinos, Em caso de felicidade mostra o valor do imprevisível e que muitas vezes é preciso se permitir mudar.
Como sempre acontece com os livros desse francês genial, eu anoto muitos, muitos quotes. Separei vários deles abaixo, só para vocês curtirem!
Trechos retirados do livro Em caso de felicidade, de David Foenkinos.
Jean-Jaques e Claire são um daqueles casais que parecem perfeitos – apenas na fachada. Na realidade, o tédio reina na relação dos dois, que tem como fruto uma menina chamada Louise. Ele resolve ter uma amante. Ela decide contratar um detetive para seguir o marido e tirar a limpo essa suspeita de traição, mas acaba se envolvendo com o próprio detetive.
Com o bom humor e as sacadas irônicas – que eu tanto adoro – de Foenkinos, Em caso de felicidade mostra o valor do imprevisível e que muitas vezes é preciso se permitir mudar.
Como sempre acontece com os livros desse francês genial, eu anoto muitos, muitos quotes. Separei vários deles abaixo, só para vocês curtirem!
O casal é o país com a menor expectativa de vida. Oito anos já são um verdadeiro feito. Jean-Jacques e Claire trocavam sinais de carinho, certamente fugazes; carinhos como vestígios; leves toques em forma de nostalgia; beijos nos cantos dos lábios como uma espécie de passeio para aquilo que um dia foram os beijos na boca. Essa cumplicidade real escondia, aos olhos dos outros, a verdadeira erosão dos dois.
Sempre preferimos as atitudes de elefante que nos deixem com uma pulga atrás da orelha às atitudes de pulgas que nos deixem com um elefante atrás da orelha. Dito de outra maneira, costumamos perdoar mais os maus mentirosos. Aqueles que dão aviso sem saber.
O que estimula todos os nossos avanços tecnológicos é o adultério: criou-se a Internet, o celular, criaram-se as mensagens por telefone unicamente para que todos os casais possam viver com facilidade as suas vidas paralelas. Acabou-se o tempo dos processos penais, a sociedade se organiza civilizadamente para permitir a discrição de nosso prazer (muito obrigado). Está tão minado o terreno da fidelidade que a questão, para os casais, não mais é saber se o outro o trai mas sim com quem o outro o trai.
- Precisa de mim? – perguntara Sonia, sem entrar na sala. E era justamente esse posicionamento feminino entre o interior e o exterior que provocara o surgimento da perturbação. Ela não tinha entrado na sala dele, mas também não se podia dizer que tinha ficado do lado de fora. Tratava-se de um espaço cinzento, e as mulheres que ficam suspensas nesse espaço cinzento acentuam a sua sensualidade. Nessa instabilidade geográfica, sem saber, elas sugerem sonhos de aventuras. (...) Sua maneira de não entrar na sala criava quase que um clima de adultério. Ela tinha com as portas uma relação das mais eróticas.
Fazia oito anos que não se via diante do corpo nu de uma mulher nova, oito anos que não descobria os ombros e o ventre, os joelhos e as ancas de uma mulher. Ele era, agora, Cristóvão Colombo. O corpo de Sonia, após anos de monogamia e de empobrecimento sensual, era a sua América.
E diante da América sempre nos sentimos um pouco pequenos.
E diante da América sempre nos sentimos um pouco pequenos.
O que pode fazer um homem tímido que já não se sente mais tímido? Sai de casa e entra no metrô. Escolhe o vagão mais cheio de gente e se coloca bem no meio. Entre duas estações, começa a gritar com muita força. Todos olham para ele, todos o reprimem com o olhar. Fica pasmo com a sua capacidade de suportar todo aquele fluxo de olhares; fica pasmo com o fato de não morrer de vergonha. Tomam-no por um louco. E logo depois o esquecem, pois ele desce na estação seguinte. Sua iniciativa foi gloriosa.
A felicidade nos faz tolerantes; ou, melhor ainda, insensíveis à intolerância dos outros.
O sexo verdadeiro é uma desconstrução social. Nos momentos em que precisava tomar ar, Claire se posicionava por cima de Igor. Seu quadril enfeitiçava as costelas dele. Ele a segurava pela nuca, e se mantinha na impossibilidade física de ser violento. Mechas de cabelo roçavam o seu torso, mas não havia risadas. Ele se concentrava nos olhos dela e neles lia, sempre, aquela exaltação íntima. Estava agora obcecado com isso. Não conseguia ler, naqueles olhos, outra coisa que não fosse aquele momento em que ela se emocionara ao saber da busca realizada pelo marido. Aquele momento de exaltação íntima, aquele momento do qual ele estava excluído. Até mesmo quando fazia amor com ele, ela deixava subsistir nos olhos a sua exaltação íntima, sua parte de vida sem ele. Só o gozo, durante o milagre de alguns poucos segundos, conseguia fazê-los esquecer de tudo. O prazer é uma amnésia, além de uma pequena morte.
Em caso de infelicidade, distribuía-se felicidade. Sua decadência era recebida como chuva no Arizona. Havia também um outro aspecto. Quando se trata de um pobre-diabo qualquer, todo mundo lamenta quando ele conta que o pai morreu, logo depois de contar que sua irmã se matou, e que o cunhado está agonizando de um câncer; é um pouco extremado, mas evidentemente ninguém consegue sentir prazer num caso como esse. Mas com Jean-Jacques era diferente: ele estava infeliz depois de passar vários anos de felicidade, e isso mudava tudo. Pela maneira como os outros o consolavam, parecia que, no fundo, ele estava pagando pela sua felicidade. Costumamos nos alegrar com a infelicidade daqueles que foram felizes.
Nós nos tornamos aquilo que os outros esperam de nós – e Jean-Jacques assumiu, então, o papel do deprimido.
(...)
- O que foi?
- Hoje é sexta-feira!
- E daí?
- E daí que você está de gravata!
Para onde caminha o mundo? Se agora não se tinha nem mesmo o direito de ser elegante estando deprimido, tudo ficava bem complicado. Jean-Jacques perdia suas referências no mundo moderno, tinha tentado ser um homem do nosso tempo, um herói simples e eficaz, um herói capaz de ter uma amante e uma vida em família, mas agora se dá conta de sua incapacidade de viver a multiplicidade de opções de vida hoje à nossa disposição. Uma prova: ele nunca fizera uma assinatura de TV por satélite; escolher era algo que o aborrecia; gostava dos restaurantes em cujo cardápio as “sugestões completas do dia” funcionavam como estradas da escolha. E agora criticavam a sua gravata. Tudo o que ele fazia estava errado. O que o salvava, finalmente, era o seu gosto pelas coisas precisas. Como com a agência de álibis, ele entraria agora num verdadeiro período de depressão, mas o faria com precisão. Na segunda-feira seguinte, foi trabalhar sem gravata. De agora em diante, só usaria gravata às sextas-feiras.
(...)
- O que foi?
- Hoje é sexta-feira!
- E daí?
- E daí que você está de gravata!
Para onde caminha o mundo? Se agora não se tinha nem mesmo o direito de ser elegante estando deprimido, tudo ficava bem complicado. Jean-Jacques perdia suas referências no mundo moderno, tinha tentado ser um homem do nosso tempo, um herói simples e eficaz, um herói capaz de ter uma amante e uma vida em família, mas agora se dá conta de sua incapacidade de viver a multiplicidade de opções de vida hoje à nossa disposição. Uma prova: ele nunca fizera uma assinatura de TV por satélite; escolher era algo que o aborrecia; gostava dos restaurantes em cujo cardápio as “sugestões completas do dia” funcionavam como estradas da escolha. E agora criticavam a sua gravata. Tudo o que ele fazia estava errado. O que o salvava, finalmente, era o seu gosto pelas coisas precisas. Como com a agência de álibis, ele entraria agora num verdadeiro período de depressão, mas o faria com precisão. Na segunda-feira seguinte, foi trabalhar sem gravata. De agora em diante, só usaria gravata às sextas-feiras.
Igor lembrou de Jules e Jim. Achava que o fato de o nome da mulher não aparecer no título do filme não era casual. O que mais pode unir dois homens é o amor por uma mesma mulher.
As coisas da vida podem ser muito simples; por isso, é ridículo não vivê-las.
Trechos retirados do livro Em caso de felicidade, de David Foenkinos.
Aline T.K.M.
Criou o Livro Lab há 12 anos e se dedicar a este projeto é uma das coisas que mais ama fazer, além de estar em contato com os mais variados tipos de expressões artísticas. Tem paixão por cinema, viajar e conhecer outras culturas. Ah, e ama ler em francês!
2 comentários
Nossa! Não conhecia esse autor e gostei bastante desse livro é um gênero que me interessa, e nossa, um quote melhor que o outro. Já seguia o blog tem um tempinho mas ainda não tinha parado pra ver o quanto era legal! Abraços.
ResponderExcluirhttp://leitorprolixo.blogspot.com.br/
Oi João, desculpe a demora rsrs! Pois é, David Foenkinos é um dos autores franceses que mais me chamam atenção, adoro os livros dele. Se você curtiu os quotes e se interessou pelo livro, recomendo muitooo que leia! E também tem um outro francês que eu adoro, o Martin Page - os livros dele são irresistíveis. Abraço e obrigada, fico muito feliz de saber que você gosta do blog. :)
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