Resenha: Norwegian Wood, de Haruki Murakami
Alfaguara 16 de janeiro de 2017 Aline T.K.M. Nenhum comentário
A travessia da adolescência para a idade adulta nunca é livre de percalços. Para uns a coisa acontece de maneira menos turbulenta; para outros, é como se um terremoto sacudisse a alma e colocasse em xeque tudo aquilo que sempre se acreditou como verdade.
Para o protagonista de Norwegian Wood, de Haruki Murakami, as coisas estão mais para a segunda opção. É 1969 e Toru Watanabe está prestes a completar 20 anos. Estudante de arte dramática em Tóquio, ele mora em um alojamento estudantil e, entre a universidade e o trabalho noturno em uma loja de discos, dedica grande parte de seu tempo aos livros.
A vida é mais ou menos tranquila, até o dia em que ele encontra Naoko por acaso. A garota de poucas palavras era a namorada de seu melhor amigo nos tempos de colégio, que cometeu suicídio aos 17 anos. Naquela época os três eram inseparáveis e, após a morte de Kizuki – e também do elo que os unia –, Toru e Naoko acabaram se distanciando. Até aquele momento.
Ao longo das extensas caminhadas que passam a fazer esporadicamente, não demora para que Toru se descubra apaixonado por Naoko. Entretanto, o trauma da morte de Kizuki ainda é muito presente neles – só que de maneiras diferentes. Não sabendo lidar com a dor, Naoko se fecha cada vez mais. Tão perto, mas ainda assim inalcançável para Toru – quase como Daisy Buchanan para Jay Gatsby, só que de um jeito diferente. Naoko é aquela personagem intrigante, misteriosa, de mente inacessível.
Mas uma outra garota também mexe com os sentimentos de Toru. Midori, que frequenta a mesma universidade que ele, tem os cabelos curtos, é adepta das minissaias e faz questão de deixar claro tudo o que sente pelo rapaz. Achei interessante o tom que Murakami deu a essa personagem. Seu jeito espevitado e às vezes infantil contrasta com as dores familiares e a maturidade que estas exigem de Midori. O ser humano em seu complexo mix de luz e sombra...
Entre a angústia da dúvida e a preocupação por Naoko, Toru embarca na vida adulta, um mundo que ainda lhe é desconhecido e que o fará amadurecer para enfrentar o que ainda virá pela frente.
E aí vem Haruki Murakami e me arrebata de novo com mais um livro. Ler Norwegian Wood foi uma experiência que eu chamaria de indescritível – cheia de sentimento, nostalgia e um certo amargor. Aqui ele mostra – de um jeito bem único, é verdade – que aqueles anos que marcam a saída da adolescência inevitavelmente vêm acompanhados de inúmeras questões e dúvidas sobre a vida e o que será dela.
Estar perdido é uma sensação frequente entre os personagens da trama. Solitários, eles parecem jogados em um mundo que ora se agita freneticamente – estamos em meio à revolução sexual e a protestos contra a Guerra do Vietnã – ora é apenas um background inerte e infértil para as dores desses jovens.
Toru nos conta essa história em primeira pessoa, em retrospecto. Ao perder o melhor amigo, aos 17 anos, ele não mais seria capaz de enxergar a morte (e a vida) da mesma maneira. “Em plena vida, tudo girava em torno da morte”, pensa Toru ao evocar seus 18 anos. Assim como ele, também Naoko, Midori e outros jovens que fazem parte de sua vida se relacionam com a morte de alguma forma.
Uma personagem já não tão jovem, chamada Reiko, entrará na trama e será importante para Toru e Naoko, ajudando-os como pode a passarem por esse momento difícil de suas vidas. Ela também tem toda uma história, um passado complicado que é revelado conforme as páginas avançam. E isso é só o que me permito dizer sobre ela, já que não costumo dar spoilers por aqui. Sorry!
Muito bem temperado com referências literárias (de Scott Fitzgerald a Thomas Mann) e musicais (a começar pelo nome do livro, a canção dos Beatles preferida de Naoko), Norwegian Wood mostra a luta dos seres humanos de Murakami para costurar feridas abertas. Ao mesmo tempo, a ânsia de se sentir vivo, de sentir – e se permitir sentir – qualquer coisa que seja.
Entre as muitas perdas e o amadurecimento, uma hora é preciso achar um lugar no mundo. Aprender a deixar para trás aquilo que já não existe e entender – por mais doloroso que seja o processo – que somente os mortos permanecem para sempre com 17 anos.
Para o protagonista de Norwegian Wood, de Haruki Murakami, as coisas estão mais para a segunda opção. É 1969 e Toru Watanabe está prestes a completar 20 anos. Estudante de arte dramática em Tóquio, ele mora em um alojamento estudantil e, entre a universidade e o trabalho noturno em uma loja de discos, dedica grande parte de seu tempo aos livros.
A vida é mais ou menos tranquila, até o dia em que ele encontra Naoko por acaso. A garota de poucas palavras era a namorada de seu melhor amigo nos tempos de colégio, que cometeu suicídio aos 17 anos. Naquela época os três eram inseparáveis e, após a morte de Kizuki – e também do elo que os unia –, Toru e Naoko acabaram se distanciando. Até aquele momento.
Ao longo das extensas caminhadas que passam a fazer esporadicamente, não demora para que Toru se descubra apaixonado por Naoko. Entretanto, o trauma da morte de Kizuki ainda é muito presente neles – só que de maneiras diferentes. Não sabendo lidar com a dor, Naoko se fecha cada vez mais. Tão perto, mas ainda assim inalcançável para Toru – quase como Daisy Buchanan para Jay Gatsby, só que de um jeito diferente. Naoko é aquela personagem intrigante, misteriosa, de mente inacessível.
Mas uma outra garota também mexe com os sentimentos de Toru. Midori, que frequenta a mesma universidade que ele, tem os cabelos curtos, é adepta das minissaias e faz questão de deixar claro tudo o que sente pelo rapaz. Achei interessante o tom que Murakami deu a essa personagem. Seu jeito espevitado e às vezes infantil contrasta com as dores familiares e a maturidade que estas exigem de Midori. O ser humano em seu complexo mix de luz e sombra...
Entre a angústia da dúvida e a preocupação por Naoko, Toru embarca na vida adulta, um mundo que ainda lhe é desconhecido e que o fará amadurecer para enfrentar o que ainda virá pela frente.
A morte não é o polo oposto da vida. Ela é parte integrante da minha existência desde o início, e é impossível ignorar esse fato por mais que eu me empenhe. Ao se apossar de Kizuki naquela noite de maio de seus 17 anos, a morte simultaneamente havia se apossado de mim.
E aí vem Haruki Murakami e me arrebata de novo com mais um livro. Ler Norwegian Wood foi uma experiência que eu chamaria de indescritível – cheia de sentimento, nostalgia e um certo amargor. Aqui ele mostra – de um jeito bem único, é verdade – que aqueles anos que marcam a saída da adolescência inevitavelmente vêm acompanhados de inúmeras questões e dúvidas sobre a vida e o que será dela.
Estar perdido é uma sensação frequente entre os personagens da trama. Solitários, eles parecem jogados em um mundo que ora se agita freneticamente – estamos em meio à revolução sexual e a protestos contra a Guerra do Vietnã – ora é apenas um background inerte e infértil para as dores desses jovens.
Toru nos conta essa história em primeira pessoa, em retrospecto. Ao perder o melhor amigo, aos 17 anos, ele não mais seria capaz de enxergar a morte (e a vida) da mesma maneira. “Em plena vida, tudo girava em torno da morte”, pensa Toru ao evocar seus 18 anos. Assim como ele, também Naoko, Midori e outros jovens que fazem parte de sua vida se relacionam com a morte de alguma forma.
– Parece estúpido fazer 20 anos – Naoko comentou. – Eu não estou nem um pouco preparada para isso. É uma sensação estranha. Tenho a impressão de ter sido bruscamente empurrada pelas costas.
– Eu ainda tenho sete meses para me preparar – falei sorrindo.
– Que sorte a sua ainda ter 19 – comentou ela com inveja.
– Eu ainda tenho sete meses para me preparar – falei sorrindo.
– Que sorte a sua ainda ter 19 – comentou ela com inveja.
Uma personagem já não tão jovem, chamada Reiko, entrará na trama e será importante para Toru e Naoko, ajudando-os como pode a passarem por esse momento difícil de suas vidas. Ela também tem toda uma história, um passado complicado que é revelado conforme as páginas avançam. E isso é só o que me permito dizer sobre ela, já que não costumo dar spoilers por aqui. Sorry!
Muito bem temperado com referências literárias (de Scott Fitzgerald a Thomas Mann) e musicais (a começar pelo nome do livro, a canção dos Beatles preferida de Naoko), Norwegian Wood mostra a luta dos seres humanos de Murakami para costurar feridas abertas. Ao mesmo tempo, a ânsia de se sentir vivo, de sentir – e se permitir sentir – qualquer coisa que seja.
Entre as muitas perdas e o amadurecimento, uma hora é preciso achar um lugar no mundo. Aprender a deixar para trás aquilo que já não existe e entender – por mais doloroso que seja o processo – que somente os mortos permanecem para sempre com 17 anos.
LEIA PORQUE
Abrir um livro do Murakami é sempre esperar pelo inesperado, aquele turbilhão de sentimentos viscerais, tristezas e muita beleza. Norwegian Wood é lindo, é delicado e é muito triste. Trata da juventude, daquela época difícil que é o início dos 20 anos, de inquietudes de jovens marcados por eventos bem específicos – tudo sob a perspectiva de um adulto que olha para trás. Recomendadíssimo.DA EXPERIÊNCIA
As pitadas de nostalgia e solidão já me indicaram de antemão que essa seria mais uma leitura inesquecível. Não me enganei; livrinho maravilhoso, este.FEZ PENSAR
Beatles (claro!), neve, vestidos retos, estampas geométricas, Bob Dylan, Janis Joplin. E também me fez pensar na adaptação para o cinema, que eu vi no exato dia em que escrevi esta resenha e é tão delicada quanto o livro.
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Título: Norwegian Wood
Título original: Noruwei No Mori
Autor(a): Haruki Murakami
Tradução: Jefferson José Teixeira
Editora: Alfaguara
Edição: 2008 (7ª reimpressão – 2016)
Ano da obra: 2000
Páginas: 360
Aline T.K.M.
Criou o Livro Lab há 12 anos e se dedicar a este projeto é uma das coisas que mais ama fazer, além de estar em contato com os mais variados tipos de expressões artísticas. Tem paixão por cinema, viajar e conhecer outras culturas. Ah, e ama ler em francês!
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