Filme “Corpo e Alma”: crueza e poesia se encontram em história de amor e inadequação
Cinema húngaro 21 de dezembro de 2017 Aline T.K.M. Nenhum comentário
Histórias de amor são sempre histórias de amor, certo? Errado.
No húngaro Corpo e Alma, dirigido por Ildikó Enyedi e que está entre as estreias desta semana no cinema, a relação entre duas pessoas pode ser crua, weird, poética, intuitiva, até mesmo em vias de se tornar trágica, antes de se transformar em uma história de amor.
Representante da Hungria no Oscar 2018, o longa nos apresenta Mária, uma mulher reservada e que não se relaciona com os demais. Ao começar a trabalhar na inspeção de qualidade em um frigorífico, ela conhece Endre, o também reservado diretor financeiro. Em sessão com uma psicóloga na empresa, ambos descobrem que compartilham do mesmo sonho, todas as noites. Na realidade, esse sonho compartilhado por Mária e Endre se trata de uma sucessão de acontecimentos em um mesmo universo, nas mesmas circunstâncias.
Eis o ponto de partida para uma possível aproximação – durante o dia, no trabalho, e à noite, em seus sonhos.
No húngaro Corpo e Alma, dirigido por Ildikó Enyedi e que está entre as estreias desta semana no cinema, a relação entre duas pessoas pode ser crua, weird, poética, intuitiva, até mesmo em vias de se tornar trágica, antes de se transformar em uma história de amor.
Representante da Hungria no Oscar 2018, o longa nos apresenta Mária, uma mulher reservada e que não se relaciona com os demais. Ao começar a trabalhar na inspeção de qualidade em um frigorífico, ela conhece Endre, o também reservado diretor financeiro. Em sessão com uma psicóloga na empresa, ambos descobrem que compartilham do mesmo sonho, todas as noites. Na realidade, esse sonho compartilhado por Mária e Endre se trata de uma sucessão de acontecimentos em um mesmo universo, nas mesmas circunstâncias.
Eis o ponto de partida para uma possível aproximação – durante o dia, no trabalho, e à noite, em seus sonhos.
Corpo e Alma, que levou dez anos para ser realizado por conta de uma crise no Instituto de Cinema da Hungria, certamente entrou para a listinha dos filmes mais bonitos que vi este ano. Para evitar que essa obra tão especial passe despercebida por vocês, faço questão de elencar a seguir alguns aspectos que fazem valer a ida ao cinema.
SOLIDÃO E INADEQUAÇÃO
Os protagonistas são desajustados social e emocionalmente, especialmente Mária. Ela tem sérias dificuldades em interagir com outras pessoas, apresenta alguns comportamentos obsessivos-compulsivos e não é receptiva ao toque.
Já Endre, apesar de se relacionar relativamente bem com os colegas de trabalho, é fechado e recluso quando se trata da vida pessoal. A impressão que temos é de que a paralisia que ele tem em um dos braços o torna menos confiante, limitando-o e configurando um empecilho maior do que realmente é.
Mária e Endre se acostumaram a uma solidão implacável, a se manterem herméticos ao mundo. O que não vivem na realidade é, de alguma maneira, articulado em seus sonhos. Nessas horas compartilhadas eles são apenas criaturas que agem por instinto, sem a pressão exercida pela condição de ser humano e pela vida em sociedade. Seu entorno no mundo onírico pode parecer hostil, mas é também sereno e traz o conforto e a familiaridade que não encontram na vida real.
INSENSIBILIDADE VERSUS POESIA
Se nos sonhos há certa poesia, a realidade não usa de eufemismos para mostrar quão brutal e pode ser. O mais simples toque machuca, macula, rasga, mata. A pureza permanece confinada, sufocada no interior. No frigorífico, os animais são abatidos. O manuseio da carne, em seguida, acontece como se não tivesse um dia sido um ser com vida, mas apenas um objeto a ser inspecionado para, então, ser comercializado. Um pouco como se mostram as relações nos dias atuais, essas imagens dialogam também com o receio de envolvimento que experimentam Mária e Endre.
Em certo momento, é difícil encarar os olhos do animal na tela momentos antes de saber que o fim o aguarda – o medo de que este fim nos seja mostrado. Porque sim, o filme não nos poupa de algumas cenas de crueza e sangue, como se estivéssemos já todos acostumados – afinal, é isso o que fazemos todos os dias uns aos outros, não?
Em tempo: para mim, este é um aspecto bem positivo do filme, muito embora eu saiba que algumas cenas podem ser desagradáveis para algumas pessoas. Aviso dado.
É a história de duas pessoas que precisam superar questões individuais e deixar que caiam as barreiras e muros que foram construindo durante a vida. Só então é que se permitirão enxergar o outro e se sentirão seguros para entregar-se por inteiro.
Em tempo: para mim, este é um aspecto bem positivo do filme, muito embora eu saiba que algumas cenas podem ser desagradáveis para algumas pessoas. Aviso dado.
UMA HISTÓRIA DE AMOR
E, apesar de tudo, é uma história de amor. Não aquela história em que homem e mulher se apaixonam e tentam ficar juntos, superar obstáculos. Antes, é o encontro, a conexão. Por um lado, a ânsia por sentir algo, qualquer coisa; por outro, o medo e a inadequação.É a história de duas pessoas que precisam superar questões individuais e deixar que caiam as barreiras e muros que foram construindo durante a vida. Só então é que se permitirão enxergar o outro e se sentirão seguros para entregar-se por inteiro.
Portanto, é preciso não esperar uma história de amor nos moldes aos quais estamos acostumados. Aqui, o ritmo é mais lento, as pausas e respiros são extremamente necessários. Tudo é muito à flor da pele, sem perder a delicadeza – quase como um vulcão em uma erupção lenta e silenciosa, completamente interna, para então transbordar de forma irremediável.
Uma história de amor que começou em sonho, literalmente. Numa dualidade entre o dormir e o acordar, duas pessoas que não se conhecem têm sonhos exatamente iguais, e acabam se encontrando diariamente todas as noites nesse mundo paralelo de fantasia. Quando chega a hora de se encontrarem de verdade, a situação se mostra ainda mais complexa.
Ganhador do Urso de Ouro no Festival de Berlim em 2017
TRAILER E FICHA TÉCNICA
Uma história de amor que começou em sonho, literalmente. Numa dualidade entre o dormir e o acordar, duas pessoas que não se conhecem têm sonhos exatamente iguais, e acabam se encontrando diariamente todas as noites nesse mundo paralelo de fantasia. Quando chega a hora de se encontrarem de verdade, a situação se mostra ainda mais complexa.
Ganhador do Urso de Ouro no Festival de Berlim em 2017
Corpo e Alma (Teströl és Lélekröl) – 116 min.
Hungria – 2017
Direção: Ildikó Enyedi
Roteiro: Ildikó Enyedi
Elenco: Alexandra Borbély, Géza Morcsányi, Ervin Nagy, Itala Békés, Júlia Nyakó, Pál Mácsai, Réka Tenki, Tamás Jordán, Zsuzsa Járó
Estreia: 21 de dezembro
Aline T.K.M.
Criou o Livro Lab há 12 anos e se dedicar a este projeto é uma das coisas que mais ama fazer, além de estar em contato com os mais variados tipos de expressões artísticas. Tem paixão por cinema, viajar e conhecer outras culturas. Ah, e ama ler em francês!
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