Filme ‘Quase Memória’: até que ponto romanceamos nossas próprias lembranças?
Adaptação 24 de abril de 2018 Aline T.K.M. Nenhum comentário
Um jornalista aposentado recebe uma visita inusitada – seu próprio eu, umas boas décadas mais jovem. Mas não é só. Um misterioso pacote chega até ele e o remetente é seu próprio pai, morto há muitos anos. Tal encontro engatilha um confronto com o passado e também um mergulho nas recordações do pai.
Eis aí a premissa de Quase Memória, filme dirigido por Ruy Guerra e que estreou na última semana. Inspirado no livro homônimo com tintas autobiográficas do jornalista e escritor Carlos Heitor Cony, o longa traz Tony Ramos e Charles Fricks como o protagonista Carlos em suas duas versões, velha e jovem.
Eis aí a premissa de Quase Memória, filme dirigido por Ruy Guerra e que estreou na última semana. Inspirado no livro homônimo com tintas autobiográficas do jornalista e escritor Carlos Heitor Cony, o longa traz Tony Ramos e Charles Fricks como o protagonista Carlos em suas duas versões, velha e jovem.
O reconhecimento entre ambos não é imediato. Quando ocorre, uma miríade de memórias toma conta dos dois Carlos, ganhando vida na forma de personagens burlescos, quase como se revestidos da fantasia de uma mente infantil. É na figura de Ernesto, o pai e também jornalista, que mora o ápice das recordações de Carlos. Excêntrico, um pouco louco até, esse pai aparece sempre associado a situações inesperadas e quase impossíveis.
Entretanto, não são apenas as memórias que ganham certo aspecto teatral no filme. O momento em que o Carlos velho e o jovem revelam suas semelhanças, em uma sequência de gestos espelhados, nos faz sentir como se tudo aquilo estivesse acontecendo sobre um palco.
Entretanto, não são apenas as memórias que ganham certo aspecto teatral no filme. O momento em que o Carlos velho e o jovem revelam suas semelhanças, em uma sequência de gestos espelhados, nos faz sentir como se tudo aquilo estivesse acontecendo sobre um palco.
Os diferentes tons de iluminação e as escolhas de enquadramento – nas lembranças e nas cenas com o protagonista duplicado – remetem a um aspecto romanceado da memória, à nostalgia de um passado tão mais colorido que o presente. E, junto com todo o resto, contribuem para plantar reflexões e questionamentos no espectador.
Até que ponto as memórias – tanto as recentes como as mais longínquas – não receberiam a tinta brilhante que as torna perfeitas sob o olhar do próprio dono meses, anos, décadas depois? Essas lembranças de fato condizem com a realidade? Ou são, antes, reflexo daquilo que tão secretamente um indivíduo deseja ter vivido? Não importa; cada qual pinta suas lembranças da cor que mais lhe apetece.
Até que ponto as memórias – tanto as recentes como as mais longínquas – não receberiam a tinta brilhante que as torna perfeitas sob o olhar do próprio dono meses, anos, décadas depois? Essas lembranças de fato condizem com a realidade? Ou são, antes, reflexo daquilo que tão secretamente um indivíduo deseja ter vivido? Não importa; cada qual pinta suas lembranças da cor que mais lhe apetece.
Além das atuações – com destaque para Tony Ramos e João Miguel, que interpreta Ernesto – e da trama a um só tempo delicada e brutal, Quase Memória chama atenção também pelo roteiro. Os diálogos entre os protagonistas jovem e velho são a melhor parte do longa e um convite a deslocar os questionamentos dos personagens para a vida real.
Quase Memória é poético e teatral, e uma mostra (entre tantas) de que rola fazer bom cinema com baixo orçamento. O longa estreou na edição de 2015 do Festival do Rio, mas chega somente agora às salas de cinema.
Não bastasse todo o filme, o final chega para coroar a história e preenche o espectador com questionamentos, possibilidades e sentimentos. E não podia ser mais justo, pois é assim, de incertezas e transbordamentos, que é tecida a vida.
Não bastasse todo o filme, o final chega para coroar a história e preenche o espectador com questionamentos, possibilidades e sentimentos. E não podia ser mais justo, pois é assim, de incertezas e transbordamentos, que é tecida a vida.
TRAILER E FICHA TÉCNICA
Quase Memória – 95 min.
Brasil – 2015
Direção: Ruy Guerra
Roteiro: Ruy Guerra, Bruno Laet e Diogo Oliveira, baseado no livro de Carlos Heitor Cony
Elenco: Tony Ramos, João Miguel, Mariana Ximenes, Charles Fricks, Antonio Pedro, Augusto Madeira, Candido Damm, Flávio Bauraqui, Thiago Justino, Inês Peixoto, Julio Adrião
Estreia: 19 de abril
Aline T.K.M.
Criou o Livro Lab há 12 anos e se dedicar a este projeto é uma das coisas que mais ama fazer, além de estar em contato com os mais variados tipos de expressões artísticas. Tem paixão por cinema, viajar e conhecer outras culturas. Ah, e ama ler em francês!
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